sábado, 28 de janeiro de 2012


"O sonho é a satisfação de que o desejo se realize."
Sigmund Freud

(Foto daqui)

Só pedia uns segundos contigo à beira-mar. Nem poderia pedir mais, tal te distanciaste física e emocionalmente. Na verdade, também seria demais pedir um mar para estar contigo. Antes, suplicaria por um livro com folhas em branco, sem título, sem imagens. Porque tudo assume uma intensidade diferente no mundo literário, levar-te-ia comigo para dentro das folhas brancas do livro e, à medida que chegássemos, a minha mente trataria do cenário, da praia, do mar, do sol e de imaginar uma tarde à minha medida, à nossa medida...
Então, certo dia levei-te para lá. Caminhávamos de frente para o mar, e metade das nossas caras, ofuscada pela luz do sol, levava a criar uma espécie de magia fotográfica, como se estivéssemos num filme em que, nem a banda sonora, nem os planos de câmara focados nas expressões faciais faltava. Destrinçando cada pormenor, não poderia deixar de referir que, porque a noção de tempo e de espaço assumem diferenças para com a realidade, cada segundo na vida real corresponderia a uma hora passada naquela história. E, porque no sonho fantasia e realidade se misturam, numa total descoordenação de tempo e espaço, eis que fomos confrontados com o tempo em sua extensão ampla: encontravam-se pois, naquela praia, nos vários pontos de intersecção, passado, presente e futuro. Todas as pessoas que pertenceram em algum momento à nossa vida, de repente, apareciam naquela praia, passando lentamente por nós como se fôssemos meros desconhecidos, como se não nos vissem. Apesar disso, nenhum de nós se moveu por um instante. Fiquei de mãos dadas a ti, e tu de olhos postos no mar, enquanto as gaivotas sobrevoavam o nosso campo de visão periférica. Podia sentir a sedução do cenário, o clamor da natureza, a fervência da tua pele colada à minha, estava frio e o sol aquecia-nos. Não te disse uma única vez que te amava, nem tu a mim. Mas não seria necessário, tampouco outra palavra, tal era a fervente e emocionante conversa que os nossos olhos trocavam enquanto o sol se punha no horizonte. Nesse momento saímos do livro...
     Estavas deitada ao meu lado e a realidade conferia uma dura sensação de frieza ao cenário, à cama, à luz do sol que entrava pela janela. Efectivamente, o sonho e a criação literária assumem contornos muito mais belos do que a realidade. Assim, daquele momento em diante, todos os dias, escreveria uma história nova naquele livro.

Afonso Costa

7 comentários:

Lipincot Surley disse...

:)

AF disse...

''Só pedia uns segundos contigo à beira-mar. Nem poderia pedir mais, tal te distanciaste física e emocionalmente. Na verdade, também seria demais pedir um mar para estar contigo...'' Isto diz tudo.
Adorei como sempre! ;)

Daniel C.da Silva disse...

Gostei do mundo criado no livro, e da forma como início e fim se conjugam :)

Um abraço amigo

Francisca. disse...

cada um tem a sua maneira, e eu tenho a minha .

LEAH disse...

Muito obrigada Afonso*

Jane disse...

obrigada. nada comparado com o que escreves e do que sentimos ao ler as tuas palavras, venho muitas vezes ler os teus textos, são tão bons e sentidos. :)

Maria disse...

Acho que podia tentar comentar todos os teus textos, mas não conseguiria, tal como não consigo comentar (mais) este. Usualmente limito-me a lê-los, pois sempre que tento comentá-los, há algo de automático que me impede: talvez porque me é impossível acrescentar-lhes o que quer que seja. A admiração que me arrebata ao ler-te... bem, fala por si, sem usar qualquer palavra e usando, ao invés, todas as sensações e mais algumas. Ainda existem verdadeiros artísticas de letras: ámen!
Devias escrever um livro, se é que ainda não o fizeste. A sério! Aproveitavas e juntavas-lhe algumas fotos tiradas por ti. É uma ideia.
Um beijinho e continua!