quinta-feira, 17 de abril de 2014


"As nossas vidas são definidas por momentos. Principalmente aqueles que nos pegam de surpresa."
Bob Marley


    "Caminhava sozinho por entre a ruidosa multidão, quando a viu pela primeira vez. Eram dez e meia da noite. Segurava, entre dois dedos, um cigarro que viria a esquecer de estar a fumar nos momentos seguintes, enquanto mergulhava na noite que se fazia desagradavelmente fria e chuvosa.
    Quando a viu caminhar sozinha por entre a mesma multidão, a apenas uns metros de distância dele, deixou que os seus sentidos se prostrassem a algo irracional que rompia com o seu consciente. Absorto da atmosfera humana que o rodeava, da noite tempestuosa que antes o desprazia, perdeu o sentido da realidade e focou-se, sem se aperceber, no seu andar suave e delicado, na sua postura descontraída e no ténue sorriso que tinha desenhado por entre os seus lábios. Eram belos. Momentos irracionalmente cinematográficos como este são raros, mas existem. E ele vivia um desses momentos, impossibilitando-lhe o decurso natural do pensamento racional e da sua consciência das coisas. As palavras e os poemas adormeceram em seus lábios, concedendo-lhe total liberdade de sentidos.
    No decurso de um curto momento que pareceu ser uma eternidade enquanto durou, só conseguiu sorrir. Algures no tempo perdido, os seus olhares cruzaram-se e eis que foi subitamente empurrado por forças, impossíveis de descrever por palavras, que o fizeram mergulhar no imenso mar azul do olhar daquela mulher. Agressivo, porém doce. De altiva confiança contrastava, porém, com uma subtil fragilidade. Um olhar que irradiava a candura de uma criança, todavia, atingia-o como com robustez de um adulto. Ingénuo, misterioso, contagiava-o, num despretensiosismo sedutor, porém dono de uma soberba firmeza que gritava de dentro de uma forte personalidade. Os olhares foram totalmente correspondidos, tendo sido provavelmente aquela onda de sintonia que o fez sentir-se ainda mais desprevenido, levando-o a uma extrema necessidade de a puxar, também, para o seu universo. Por conseguinte, foi nesse momento que, por impulso totalmente irracional, e porque jamais em toda a sua curta vida teria vivido um momento como aquele, se dirigiu a ela e proferiu a primeira palavra.
Olá."

Poc Poc Poc,

Afonso Arribança

1 comentário:

Jessica disse...

Maravilhoso. Há tanto tempo que não passava pelo teu blog, já tinha saudades de ler o teu jeito com as palavras, Afonso :)

Beijinho!