quarta-feira, 2 de junho de 2010


"Posso dizer-te quem fui ontem mas jamais te poderei dizer quem eu sou hoje" 

Sabes ? O vento já não sopra. Ou eu já não o sinto. Não importa... Quis o vento deixar-me entregue às chamas que latejam no meu peito, e quiçá tenha até tomado partido de levar consigo as quiméricas palavras da minha consciência. Dantes, até o mar conversava comigo, horas a fio, como dois bons velhos amigos, mas agora... Entregue ao mortal silêncio das minhas inseguranças, latejo... Mas não importa.
Não importa porque eu morri física e psicologicamente por tempo indeterminado e, cega a minha própria compreensão, acabo por me entregar à noite de lua cheia. Repito vezes sem conta as mesmas preces convencendo-me de que tudo está bem. Mas não está.
Sabes que, apesar de tudo isto, ou talvez por causa de tudo isto, do que foi dito - e do que ficou por dizer -, gosto de te sentir no meu coração e, apesar de não poder afirmar que te amo, pois talvez não ame, na verdadeira acepção da palavra, a única certeza que te posso dar é que estás presente na minha mente mais de metade do tempo em que estou acordado. Mas não importa.
A lua está cheia e eu literalmente me entrego à chacina dos meus próprios sentimentos, prostrado a teus pés oh noite, imperatriz dos meus sentimentos neste sórdido ritual de palavras nonsense... Sinto-te poeticamente nas entrelinhas do que não foi nem nunca será dito e vivo o momento... Como que drogado por substâncias fóbicas da tua ausência e da minha própria inexistência, acabo por partir em busca de respostas que me expliquem o porquê da minha partida e o destino da minha existência. Quando olhei para as águas do rio e não vi a minha sombra, percebi que tinha perdido a minha essência não sei onde, há não sei quanto tempo atrás e que estava disposto a reavê-la. Quando me perguntaste quem eu era, eu respondi-te "posso dizer-te quem eu fui ontem, mas jamais te poderei dizer quem eu sou hoje..."
Quando acordei e percebi que tinha estado a sonhar, não escutei nem vento, nem mar e num ímpeto quebrei o silêncio do imenso deserto de areia em que de repente me descobri e gritei por mim...
Onde estou eu ?
(o que os exames não fazem a uma pessoa...)
Afonso Costa

15 comentários:

Anónimo disse...

Oh é tão bom deixar a imaginar fluir durante o sono dando origens a sonhos em que tudo pode ser vivido, em que podemos interagir com pessoas que já nos foram tanto e que lá bem no fundo ainda continuam a fazer parte de nós.
Muitas vezes perguntamo-nos onde estamos mas isso é perfeitamente natural quando se sente falta de algo ou de alguém.
Depois de um belo sonho custa tanto voltar á realidade.

Beijinho *

Anónimo disse...

Engraçado, já tive uma experiência idêntica a esta e andei perdida durantes uns tempos. Mas consegui encontrar-me. :)
Adorei o texto.

Beijinhos

Sophia disse...

Fazem bem : )

paula disse...

Uma pessoa não se conta, não se dizem...não se definem. Cada uma é unica, especial e tem algo de bonito a admirar no seu interior. E, sendo unicas, diferentes, sentimos de maneira diferente fazemos tudo de maneira diferente ainda que pareça igual. Podem muitas pessoas ler o teu texto que entende-lo-ão de maneira diferente talvez todas certas e certamente que nenhuma será a tua. Assim somos nós e os sentimentos. Não há palavras que os definam, nem pessoas que o façam só nos sentimos só os definimos atraves das palavras que nao sao ditas.

Muitas pessoas entenden-nos, outras conhecem-nos mas só as que partilham momentos com connosco nos conseguem conhecer no hoje. (:

Gostei do texto trouxe-me verdades que nao tinha reparado.
p.s - Muito obrigada pelo comentário

Anónimo disse...

Adorei a musica, pois essa musica é de um dos meus filmes favoritos

Anónimo disse...

As vezes só precisamos de um tempo para voltar a encontrar-nos e acredito que acabarás por te encontrar, não digo como antes porque isso é dificil mas se calhar encontres algumas partes de ti de que tens saudades.

Em relação ao meu texto, escrevio mais para que as pessoas entendam que se quisermos as relações podem resultar não na totalidade como por exemplo as amorosas, mas as outras resultam na perfeição se ambas as partes quiserem. A tua ultima frase é bem verdadeira mas por vezes esquecemo-nos que se sonharmos e não tivermos consciencia da realidade as coisas podem dar para o torto :P Podemos sonhar mas temos de ter atenção á altitude a que sonhamos .

Beijinho *

Flávio Miguel Mata disse...

Já tinha ouvido falar desse senhor, e realmente as novelas escritas por ele são as melhores que passam na televisão. As mais reais, com mais interesse e que viciam. Também acompanhava as Páginas da Vida, e também gostei imenso.
Obrigado por seguires. Beijinho *

Jessica disse...

Obrigada pelo comentário. Sabes? Eu gosto, gosto muito, dos teus comentários. Não por que são grandes/pequenos ou porque simplesmente é mais um comentário. Gosto, porque os fazes quando tens definitivamente algo para dizer, e sabes do que falas. Gosto dos teus comentários porque têm sempre O Afonso lá espelhado - este mesmo que nos presenteia com viagens por entre as palavras.
É por isso que gosto, e tinha que o dizer :)

Ainda que não reconheças o sítio por onde andas; que tudo te pareças perdido, lembra-te que há sempre um ínfimo, e ainda valioso, pedaço de espaço oculto em que nos podemos encontrar sempre: em nós, bem cá dentro.
E é impossível!, impossível mesmo, alguém assim - como tu - perder a sua essência. :)

(Agora a senhora-dona dos comentários grandes, fui eu. ahah)

Um beijinho Afonso *

maria eduarda disse...

está fantástico sem dúvida.
e sim, a sensação de borboletas no estomago é deliciosa, mas há sempre o medo que essa sensação vá embora, não é bom quando isso acontece.
quanto ao teu texto, já disse que está fantástico, é lindo como tu usas as palavras. continua :)

Anónimo disse...

Por mais que se tente nunca conseguimos defenir quem somos. E os Maias é algo de fantástico para se ler. Deliciei-me com eles.

beijinho ^^

Dianne disse...

Só irá originar-me uma autêntica guerra..

Maria Francisca disse...

Oh, meu querido Afonso, há quanto tempo. Quando leio os teus textos associo ao início do meu blog, quando tu, o Davie e a Inês me deliciavam e saciavam o desejo de amizades interessantes.
A música que tens no blog vai tão bem com este texto. Tão tão bem.
Eu também não sei bem onde estou.

maria beatriz disse...

"Posso dizer-te quem fui ontem mas jamais te poderei dizer quem eu sou hoje" é completamente verdade, porque nós, os de então, nunca somos os mesmos.
A música é brilhante e é quase como um espelho do teu texto.

Mariana Neves disse...

«Sabes que, apesar de tudo isto, ou talvez por causa de tudo isto, do que foi dito - e do que ficou por dizer -, gosto de te sentir no meu coração e, apesar de não poder afirmar que te amo, pois talvez não ame, na verdadeira acepção da palavra, a única certeza que te posso dar é que estás presente na minha mente mais de metade do tempo em que estou acordado. Mas não importa.»
- na próxima noite, não te procures na lua do céu, procura-te na lua do teu olhar. não te tentes sentir no mar azul, tenta sentir-te no mar vermelho que te percorre as veias. o que tu és, não está no exterior, mas sim em ti próprio, cabe-te a ti, tentar desvendá-lo, procurá-lo, reconhece-lo. com tempo consegues. até lá, dança ao bater do teu coração.

IC disse...

Chorei a ler isto. Lindo!